terça-feira, 29 de setembro de 2009

Fumar destrói também o meio ambiente

Os governos estaduais começam finalmente a agir para o banimento do cigarro em ambientes de uso coletivo, defendendo do tabagismo não apenas o fumante, mas todos os demais, inclusive crianças, que também absorvem os danos.

Em agosto, a proibição virou lei no estado de São Paulo. A partir desta semana também no Paraná será proibido fumar em ambientes fechados. No Rio de Janeiro, cidade pioneira desta saudável onda, isto já acontece desde 2008.

A concentração de dióxido de carbono em um ambiente fechado pode atingir números altíssimos. Antes da proibição, ao medir a quantidade de fumaça de cigarro em boates de São Paulo, o jornal Folha de S. Paulo encontrou índices entre 10 e 14 ppm (parte por um milhão), quantidade parecida com a de ruas de tráfego movimentado, como a Avenida Paulista.

Os danos que o cigarro provoca para a saúde são tão indiscutíveis que a Philiph Morris, maior fabricante mundial, recentemente tentou conceituar positivamente a morte precoce dos fumantes, alegando que isso acabaria sendo favorável à economia. É um argumento revoltante, mas absolutamente coerente para uma indústria sempre implacável no relacionamento com a opinião pública.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) considera o tabagismo a principal causa de morte evitável em todo o mundo, com cinco milhões de mortes por ano. 100 milhões de pessoas morreram no século XX e para este século a OMS prevê a morte de mais de um bilhão de pessoas ao redor do mundo, se os governos não agirem com rigor.

O tabaco mata e causa deformações horríveis, como mostram as imagens obrigatórias impressas nas embalagens. Mas além dos males diretos sobre o corpo, o meio ambiente também é seriamente afetado.

A lavoura do fumo tem uma alta exigência de adubos químicos e agrotóxicos, fatores altamente prejudiciais para a terra, rios e mananciais. O Brasil é o segundo maior produtor mundial de fumo, abaixo apenas da China. Por esse número, já dá para imaginar a quantidade de terras agriculturáveis tomadas por um tipo de cultura que, no final, não compensa os altos custos exigidos para combater seus danos.

A natureza sofre também os efeitos da secagem das folhas do fumo, em estufas alimentadas com lenha. Parte desta madeira vem do eucalipto, mas pelo menos 50% é extraído de matas nativas, com especial dano para a Mata Atlântica, que tem à sua volta grande parte das plantações brasileiras de fumo.

Segundo dados da Associação de Fumicultores do Brasil/Afubra, em 2006 a área plantada com o fumo no Sul do Brasil foi de 417 mil hectares.

Especialistas fizeram as contas em 2007 e chegaram à conclusão que os 120 mil fornos da chamada cura do tabaco consomem 13,2 milhões de metros cúbicos de lenha.

A queima de tanta madeira evidentemente também contribui para o aquecimento global. E como na produção do tabaco são utilizados fertilizantes nitrogenados, acaba sendo liberado para a atmosfera o óxido nitroso (N2O), um gás que é 310 vezes mais potente que CO2 para reter o calor na atmosfera do planeta.

Outro efeito sobre a cobertura vegetal nativa, que já sofre demais com o plantio, vem depois, com os inumeráveis incêndios que começam com uma ponta de cigarro jogada no mato seco. Estas queimadas, que destroem inclusive muitas áreas de preservação, são estimadas em 25% do total de incêndios na natureza.

E após a fumaça mortífera, vem o lixo do resto do cigarro ou charuto depois de fumado. Aquela sujeira que abarrota em pouco tempo um cinzeiro demora anos para se decompor. Um estudo realizado por biólogos da USP mostrou que uma bituca permanece na natureza por períodos nunca inferiores a dois anos. Os filtros dos cigarros são ainda mais resistentes, poluindo solo e água por mais de cinco anos.

O hábito de fumar, portanto, acaba com o fumante e com tudo e todos que o cercam.

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

O cerrado brasileiro cortado pela metade

Neste dia 11 de setembro, quando é comemorado o Dia do Cerrado, o Ministério do Meio Ambiente e o Ibama divulgam um estudo que revela que já foi destruída quase metade da área original deste importante bioma brasileiro. Uma extensão de quase 1 milhão de quilômetros quadrados de mata foi posta abaixo para fazer carvão que abastece siderúrgicas e para a terra ser usada no plantio da soja ou para a pecuária.

O desmatamento vem desde os anos 1970, mas os dados revelam um aceleramento recente no ritmo da devastação. Entre 2002 e 2008 teriam ocorrido entre 5% e 6% do total desmatado — uma área próxima dos 120.000 km². Para se ter uma idéia do estrago, o estado do Paraná tem 199.314 km².

O cerrado sempre foi tido em menos conta na agenda ambiental brasileira, tomada praticamente toda pela questão da Amazônia. O cenário de árvores tortas e pequenas acabou sendo ofuscado pela imensidão da floresta amazônica, mas é um erro ignorar a interdependência entre os dois biomas. No cerrado estão as nascentes dos principais rios das bacias Amazônica, da Prata e do São Francisco.

Um terço da biodiversidade brasileira está no cerrado. Já foram registradas mais de 12.000 espécies de plantas, muitas delas só lá encontradas. 40% de suas plantas lenhosas nascem apenas neste ambiente e 50% das espécies de abelhas só existem ali.
Sobre esta riqueza impressionante pode-se lembrar um exemplo dado pelo jornalista Washington Novaes, um especialista de grande conhecimento na área do meio ambiente.

No ano de 1992 ele escreveu que um professor identificou e classificou quase 300 espécies de orquídeas só no território do Distrito Federal, com pouco mais de 5 mil quilômetros quadrados. Na Amazônia, ele conta, um território mil vezes maior, conhece-se pouco mais de 300 orquídeas.

Mas de lá para cá muito foi destruído. Originalmente, 14% do território de São Paulo era ocupado por vegetação típica do cerrado. Hoje resta apenas 0,84% da área do Estado. O cerrado de Minas Gerais foi quase todo derrubado e consumido por carvoarias.

A aparente aridez do cerrado não permite perceber que temos ali um importante bioma para a preservação dos nossos recursos hídricos. O cerrado é a caixa d’água do Brasil, como bem disse Cesar Victor do Espírito Santo, do Conselho da Rede Cerrado, que congrega mais de cem ONGs. Além das três principais bacias hidrográficas citadas, cujas principais nascentes estão no bioma, por debaixo do solo de vários Estados do cerrado está o Aquífero Guarani.

Com todo este peso ambiental, no entanto o cerrado é o chamado “primo pobre” dos biomas brasileiros, sempre esquecido dos poderes públicos e maltratado por um modelo econômico que usa o meio ambiente apenas como recurso para o lucro fácil e rápido.

O descaso com o cerrado tem até um aspecto simbólico, como no fato de serem patrimônios nacionais a Floresta Amazônica, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira. Quanto ao cerrado, há uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que solicita seu reconhecimento, junto com a Caatinga, como patrimônio nacional.

Pois a PEC tramita há 14 anos no Congresso Nacional. Agora, com quase metade deste bioma destruído, o Brasil tem que correr contra o tempo e tomar medidas práticas. Ou não sobrará patrimônio algum para o Congresso oficializar.

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Usina Mauá e os riscos para o futuro das águas do Paraná

Com o desvio temporário do Rio Tibagi, foi concluída a primeira etapa da instalação da Usina Hidrelétrica de Mauá, no Paraná. Ocorrido na última terça-feira em clima de comemoração, o evento contou com todo o aparato de propaganda política próprio de uma inauguração pública.

A usina vai alagar uma área de alta biodiversidade entre as cidades de Telêmaco Borba e Ortigueira, numa região que conserva hoje apenas 3,7% de sua mata nativa original. O funcionamento da usina também estará relacionado ao fornecimento de água potável para uma populosa região. Londrina, a segunda maior cidade do Paraná, tem 60% de seu abastecimento fornecido pelo Tibagi. Além disso, o rio tem influência direta na vida de cerca de 40 cidades.

O Rio Tibagi é também importante reserva estratégica de água potável, numa época em que tudo aponta para uma escassez futura. Apesar de todas estas considerações, a construção da Usina de Mauá vem sendo tocada pelo governo Requião feito um trator, passando sobre as opiniões divergentes de técnicos e ambientalistas que vêm alertando há anos sobre os graves impactos ambientais.

Um dos problemas levantados é o do surgimento de algas tóxicas, já que a usina mudará a condição do Tibagi, que de um rio de corredeiras passará a ser de águas quase paradas. Em dezembro do ano passado a própria empresa estadual de saneamento, a Sanepar, acabou concordando com o risco.

Em resposta a questionamentos do Conselho Municipal de Meio Ambiente de Londrina (Consemma) sobre o problema das algas tóxicas, a gerência metropolitana da Sanepar afirmou que além de ser mesmo provável no futuro, a proliferação de algas no manancial já havia ocorrido no ano de 2006, em razão de prolongada estiagem.

Por coincidência, em paralelo com a comemoração do desvio do rio, a Sanepar informava que deve aumentar a rede de captação de água do Tibagi com os financiamentos obtidos este mês junto a Caixa Econômica Federal e o BNDES.

Mas apesar de bastante preocupante, as algas não são a única questão problemática. Na opinião de ambientalistas, a pressa na construção da usina fez o governo deixar de lado até procedimentos básicos no estudo dos impactos e na preservação ambiental.

Nas discussões ocorridas recentemente no Comitê da Bacia do Rio Tibagi, por exemplo, a construção da Usina Mauá foi ignorada. O Comitê aprovou o diagnóstico da bacia sem considerar a obra e, segundo os críticos, baseado apenas em informações superficiais e até falsas.

O mapa da cobertura florestal, segundo Laila Menechino, da Ong Meio Ambiente Equilibrado (MAE), considera um cenário da década de 1920, com a floresta nativa original preservada. “Hoje a bacia tem 3,7% da mata nativa preservada”, ela diz.

Segundo alguns participantes, aconteceram até manipulações para facilitar a aprovação do diagnóstico. Carlos Levy, membro do comitê e secretário do Meio Ambiente de Londrina, reclamou da condução dos trabalhos, afirmando que “enquanto achava que votávamos para aprovar a ata da reunião, estávamos votando para aprovar o diagnóstico”.

Mesmo considerando a vantagem que um empreendimento como a Usina Mauá pode trazer em termos de oferta de energia, não há como deixar de levar em conta que perigos ambientais tão graves exigiriam ação mais cuidadosa, sem falar em seriedade e transparência, até mesmo porque é algo público.

Com o impedimento das opiniões divergentes e o desprezo por estudos sérios e feitos com a intenção de ampliar a compreensão sobre o assunto, o caso da Usina Mauá até levanta suspeitas de que o interesse no efeito eleitoral de uma grande usina hidrelétrica é bem maior que a atenção aos problemas que podem ser causados ao meio ambiente.

Mas os riscos são muito grandes para que se pense tão pequeno. Aqui, vale tanto a frase popular, que diz que “a pressa é inimiga da perfeição”, quanto a alta filosofia, nos conselhos de Karl Popper, que afirma que o risco de futuros eventos indesejáveis exige sempre que se aumente a cautela.