sábado, 21 de março de 2009

Com desmatamento não há lucro futuro

Um relatório da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO) divulgado esta semana trouxe dados preocupantes sobre o desmatamento no mundo. O relatório coloca o Brasil em péssima situação quanto à conservação de suas matas.

No estudo, que analisa a perda absoluta de florestas entre 2000 e 2005, o Brasil figura como responsável por 42% de hectares da mata cortada em todo o mundo nesse período. O total mundial chegou a 7,3 milhões de hectares. No Brasil, a perda foi de 3,1 milhões de hectares anuais.

No Brasil, segundo a FAO, houve uma aceleração no desmatamento em comparação com o período entre 1995 e 2000. Naqueles anos, os cortes totalizaram 2,6 milhões de hectares.

O mundo perdeu a cada dia 200 quilômetros quadrados de florestas. E as projeções futuras do órgão da ONU apontam para a continuidade desse processo de devastação. Em nosso país, a expansão da agricultura e da pecuária e também a produção de biocombustíveis são elementos de estímulo ao crescente desmatamento.

Este relatório da FAO compilou dados até 2005, mas de lá para cá todos os estudos mostram que o desmatamento tem aumentando bastante e em alguns casos até com a justificativa de que isso faz parte do desenvolvimento econômico. Tal equívoco é estimulado pelo próprio presidente Lula quando ele diz coisas como que “entre um cerradinho e a soja” ele fica com a soja.

Colocar a destruição ambiental como um ônus inerente ao progresso é um raciocínio que favorece apenas aos que buscam o lucro fácil sem consideração com os graves problemas criados para toda a humanidade. Para este tipo de desenvolvimento econômico sem dúvida é imprescindível a destruição do meio ambiente.

Porém, esta é uma dicotomia falsa. Não pode haver conflito entre a preservação do meio ambiente e o progresso, pois quando isso acontece o próprio desenvolvimento acaba sendo de curto prazo, com o risco inclusive de um retrocesso que pode custar mais caro que os lucros obtidos durante a experiência.

A situação do planeta no aspecto ambiental é tão delicada que até proposições tidas como positivas para o equilíbrio ecológico exigem um debate aprofundado, pois onde parece existir uma solução pode estar o agravamento do problema.

A questão do biocombustível está neste plano. Quando a produção do biocombustível avança sobre nossas florestas, então o argumento ecológico deixa de fazer sentido. Aí o projeto deixa de atender a expectativa principal e se restringe ao aspecto meramente econômico.

Há cerca de um ano o jornalista Washington Novaes, um pioneiro brasileiro em ecologia e um dos melhores textos na área, escrevia sobre a produção do biocombustível na Indonésia, outro país campeão mundial em desmatamento.

Na Indonésia o desmatamento ocorre em florestas encontradas em pântanos turfosos. Isso acaba provocando a liberação intensa de dióxido de carbono, já que na turfa de áreas como essas, no Sudeste Asiático, estão armazenados cerca de 155 bilhões de toneladas de CO2, o que dá seis vezes as atuais emissões anuais no mundo. Os dados ele extraiu da revista New Scientist.

Então Novaes faz a pergunta inevitável: “Vale a pena, por exemplo, desmatar uma área e drenar o terreno turfoso, se ele libera 30 vezes mais dióxido de carbono do que a redução que é conseguida com o biocombustível produzido naquela área?”

São questões como essa que devemos avaliar quando nos defrontamos com números como estes divulgados agora pela FAO. Para onde nos leva um desenvolvimento econômico que agride o meio ambiente, provoca o aquecimento da Terra e cria outros problemas globais, além de deixar em nosso próprio país o terreno devastado e imprestável para o futuro?

Evidentemente fazemos uma pergunta retórica. O destino reservado aos brasileiros por um modelo como este pode ser previsto pelos problemas que já vivemos atualmente. E não podemos esperar a conta do futuro para só então denunciar que um progresso à custa do meio ambiente não vale sequer o seu lucro imediato.

terça-feira, 17 de março de 2009

Fraternidade e democracia na vida e na política

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) vem promovendo desde dezembro de 1963 a sua Campanha da Fraternidade, que já tratou dos mais diversos temas da realidade brasileira focando em cada ano uma questão como objeto de estudo, debate e reflexão entre os católicos.

A Campanha já teve como tema inclusive a água, assunto tratado em 2004, quando se discutiu o risco da escassez e a necessidade da preservação dos nossos recursos hídricos.

A seriedade de cada Campanha acaba sendo bastante esclarecedora, estimulando a participação da população em geral no debate dos problemas brasileiros e contribuindo sobremaneira para a conscientização de todos. Ao destacar um determinado tema em atividades que envolvem os católicos de todo o Brasil, o assunto também acaba se tornando pauta jornalística, merecendo a atenção de jornais, revistas, rádio, televisão e agora também os blogs e sites da internet.

Como a CNBB frisa em seu site na internet, suas Campanhas tem como objetivo permanente despertar o espírito comunitário na busca do bem comum, estimulando a consciência de todos em vista de uma sociedade justa e solidária.

O tema da Campanha deste ano foi “Fraternidade e Segurança Pública”, assunto dos mais pertinentes em um país como o nosso que sofre muito com os problemas da injustiça e da insegurança.

A violência avança por todo o país. Agora o problema existe até nas pequenas cidades, com as pessoas sendo obrigadas a cercar de grades suas residências como antes só acontecia nas grandes cidades.

O problema é de tal ordem que uma cidade como o Rio de Janeiro, historicamente conhecida pela cordialidade de seu povo, tem no momento grande parte de sua população sob o domínio de milícias armadas, formadas por bandidos, ex-policiais e até policiais da ativa. Cerca de 20% de suas comunidades estão dominadas por bandos armados, com poder sobre a vida pessoal dos moradores e usando o terror até para impor taxas sobre serviços essenciais como a venda de gás de cozinha.

A ausência oraticamente total do Estado acabou criando um poder paralelo que reina acima das leis e da Constituição. A situação é tão grave que estes grupos já começaram a influir diretamente nas eleições, como ocorreu no ano passado na Rocinha, uma das maiores favelas do rio, onde o tráfico e milícias armadas usaram o terror para forçar a comunidade a votar em candidatos ligados ao crime e impedir o acesso de outros candidatos à favela.

A relação do crime com a política também já se exerce em vários cantos do país em ameaças de morte a religiosos, lideranças políticas, promotores públicos, sindicalistas e parlamentares progressistas.

Esta é uma das faces mais perigosas da violência. Quando aliados ao crime os poderosos começam a instalar o medo para evitar que o debate democrático e a justiça sejam os condutores da vida nas comunidades, tal situação é prenúncio de grave desestabilização social, que pode chegar ao caos com a total falência do Estado.

Esta é uma situação vivida atualmente pelo México, país em que a violência veio em um crescendo cada vez mais rápido até chegar ao ponto das organizações criminosas terem um poder maior em certos estados que o próprio governo federal.

Caso a violência não seja contida com urgência no Brasil, não seria alarmismo prever que a condição atual do México pode ser um panorama brasileiro bem provável em um amanhã bem próximo.

E para que o nosso país não experimente um futuro tão dramático é essencial agir com intensidade agora, fazendo da fraternidade um elemento destacado nas relações sociais e separando com vigor os homens e mulheres de bem daqueles que querem fazer do medo uma arma política.